domingo, 27 de abril de 2014

Análise: Material World Paranoia (Kreator)




Material World Paranoia
Kreator – Album: Coma of Souls (1990)

Dehumanization through industrialization
Bring fear to the masses of reincarnation
Manic frustration deterioration
Nature fights back for its own preservation

Concrete coffin breeds lunacy
Cold steel skeleton
Desperation in the factory
Crank out oblivion

Material world paranoia
Corporations rule the earth
Material world paranoia
Enslavery begins at birth

Power's illusion brings global confusion
A forgone conclusion of mind's evolution
Nature's destruction through massive production
A blatant example of mindless construction

Concrete coffin breeds lunacy
Cold steel skeleton
Desperation in the factory
Crank out oblivion

Material world paranoia

Don't dream about how life can be
Experience your dreams
Before this prefab culture wastes your life
Stay on the straight and narrow course
Material wealth is yours
But the promise of a better future is a lie

The promise of a better future is nothing but a lie!

Paranóia do Mundo Material (tradução)

Desumanização através da industrialização
Traz o medo às massas da reencarnação
Maníaca deterioração da frustração
A natureza luta por sua própria preservação

O caixão de concreto  produz o lunático
Esqueleto de aço frio
Desespero na fábrica
Roda para fora o esquecimento

Paranóia do mundo material
As corporações governam a terra
 Paranóia do mundo material
A escravização começa no nascimento

A ilusão do poder traz a confusão global
Uma conclusão renunciada da evolução da mente
Destruição da natureza através da produção em massa
Um exemplo claro de construção sem sentido.

O caixão de concreto produz o lunático
Esqueleto de aço frio
Desespero na fábrica
Roda para fora o esquecimento

Paranóia do mundo material

Não sonho sobre como a vida pode ser
Experiência de seus sonhos
Antes dessa cultura prefabricada desperdiçar sua vida
Esteja no curso reto e estreito.
A riqueza material é sua
Mas a promessa de um futuro melhor é uma mentira

A promessa de um futuro melhor não é nada mais que, uma mentira!

________________________________________
Análise:

Se para os alemães do Scorpions o mundo na virada de 1990 para 1991 estava caminhando para a tão almejada paz e progresso da humanidade, em sua otimista canção “Wind of Change”, para os seus conterrâneos do Kreator tinha uma visão menos entusiasmada se analisarmos a canção “Material World Paranoia” do álbum Coma of Souls (1990).

Para toda uma geração de jovens, o mundo caminhava para o caos absoluto, convivendo com a violência, o desemprego, e toda sorte de desajuste social. O aumento da desigualdade aumentou por toda a parte, seja entre os países, seja entre regiões do mesmo país, seja em populações do mesmo país. (HOBSBAWN, 1995 p. 396-395)

Em poucas músicas o Kreator deixa tão explícito o qual é o seu posicionamento ideológico quanto às questões sociais, econômicas e políticas. É uma canção cujo o mote é a anarquia, evocando conceitos da consolidação do capitalismo, como a mecanização industrial, e a corrida da URSS pela mecanização como forma de mostrar o esplendor do seu modelo econômico.

A primeira estrofe apresenta o tema, o sentimento e o tom que da letra que vai desenvolver-se: “Dehumanization through industrialization”. O ser humano perde espaço para a produção, onde o resultado é mais importante que as relações, que os anseios e o bem estar das pessoas. Essa situação leva à frustração e a deterioração do trabalhador, pois se torna mais uma peça na engrenagem do sistema, sendo dispensável como indivíduo, visto a mecanização, e aqui não entendida somente como trazer as maquinas para o centro da produção, mas também tornar o processo inteiro feito pelos trabalhadores de forma repetitiva.

O bridge faz referências a conceitos do início da era industrial, como eventos que deram origem ao Ludismo, quando diz “Concrete coffin breeds lunacy”, onde o “caixão de concreto” é entendido como uma figura de linguagem para a fábrica (onde as pessoas sepultam suas esperanças, vida social e futuro). Segue com outra figura de linguagem “Cold steel skeleton” tratando das máquinas que substituem os trabalhadores, tendo como consequência o desemprego maciço, arrocho dos salários e uma série de problemas sociais decorrentes (HOBSBAWN, 1995 p. 402).

O refrão “Material world paranoia / Corporations rule the earth / Material world paranoia / Enslavery begins at birth” desenrola mais um conceito contido na canção. Até o momento falava-se da produção, mas agora trata da própria natureza da produção em massa: o consumo. Quando diz que a “escravidão começa ao nascer” está dizendo sobre a necessidade de consumo que o mundo contemporâneo impõe, e logo, a necessidade das industrias continuarem produzindo materiais e reproduzindo o seu lucro.

A próxima estrofe que segue, “Power's illusion brings global confusion / A forgone conclusion of mind's evolution”, e reforça a ideia sustentada no refrão, quando diz sobre o poder financeiro, que se confunde com sensação de poder total (o dinheiro pode fazer tudo). Com o fim do modelo socialista, principalmente com a reunificação alemã, o mundo viu a “vitória” dos modelos de economia de livre mercado, mas os riscos disso foram subestimados, e a economia ocidental não foi capaz de absorver milhões de consumidores de uma hora para outra. Principalmente do tocante à finda Alemanha Oriental. (MONIZ BANDEIRA, 2009, P.188-190)

A crítica feroz ao sistema de produção industrial desenfreado e irresponsável continua: “Nature's destruction through massive production / A blatant example of mindless construction”. O custo de produzir sem pensar nas consequências sociais e ambientais, na visão do Kreator, é um exemplo claro de um progresso apenas visto como ganho financeiro, pois ninguém estaria medindo os custos para a sociedade desse tipo de produção.

Quando volta ao refrão, temos a  mesma imagem do homem massacrado pela produção fabril, mas agora num novo contexto. Ele está inserido na produção industrial, e também quer ser um consumidor. Trabalha horas a fio durante o mês, recebe seu salário e vai até a loja comprar o tênis do famoso jogador de basquete que (talvez ele mesmo ou outro trabalhador como ele em qualquer parte do mundo) produziu repetitivamente. O ser humano perde a capacidade da reflexão sobre o trabalho em si mesmo, e passa também a ser mais uma peça no engenho do consumo. As mídias passam a imagem que consumir é ser feliz, e que ter é muito melhor que ser.

A crítica ao consumo midiático da massa segue na estrofe “Don't dream about how life can be / Experience your dreams / Before this prefab culture wastes your life / Stay on the straight and narrow course”. É um ciclo, onde a produção enseja em consumo, que pede uma propaganda para elevar o consume, e por consequência, continuar a produção fabril. Quando cita a “cultura pré fabricada” está falando exatamente de como a mídia de massa cria necessidades que “não sabíamos que precisávamos” (MERTON e LAZARSFELD 2000, p.109-131)

A sociedade do consumo é duramente criticada nas linhas “Material wealth is yours But the promise of a better future is a lie”, que sintetiza toda a força da letra. Conclui que a natureza efêmera da riqueza material não é capaz de trazer a felicidade ao ser humano. Naquele momento, os governos, as corporações transnacionais, e em particular os grandes donos dos meios de produção, falharam em tornar o mundo um lugar melhor. É como se o eu poético estivesse com o dedo em riste apontando para um grande empresário e dizendo que não importa o que faça, não há progresso sem justiça social.

Essa ideia está intimamente ligada à reunificação alemã, onde a população da Alemanha Oriental não queria esperar nada para ter acesso às mesmas coisas que seus compatriotas do lado ocidental já tinham. Após décadas de privação dos itens mais básicos, eles agora queriam televisores, carros, salgadinhos, refrigerantes. Queriam ser incorporados ao sistema do consumo, e ser reconhecidos por isso (MONIZ BANDEIRA, 2009, P.183-185)

O fim dos anos 80 e início dos anos 90 do século XX foram especialmente difíceis para o desenvolvimento econômico e social por todo o mundo, e o texto de Eric Hobsbawn é praticamente uma tradução da canção “Material World Paranoia”:

A tragédia histórica das Décadas de Crise foi a de que a produção agora dispensava visivelmente seres humano mais rapidamente do que a economia de mercado gerava novos empregos para eles. Além disso, esse processo foi acelerado pela competição global, pelo aperto financeiro dos governos, que – direta ou indiretamente – eram os maiores empregadores individuais, e não menos após 1980, pela então predominantes teologia de livre mercado que pressionava em favor da transferência de emprego para formas empresariais de maximização de lucros, sobretudo para empresas privadas que, por definição, não pensam em outro interesse além do seu próprio, pecuniário. (HOBSBAWN, 1995, p. 404)

E ideia que o progresso traria a felicidade para o homem, muito em voga nos positivistas do início do século XX (como o sociólogo Emile Durkheim) é jogada por terra segundo as palavras do Kreator, quando repete no fim da canção a frase “a promessa de um futuro melhor não é nada mais que uma mentira”, como um grito raivoso para que as pessoas abram a mente para entender o que realmente é importante na vida.

Com uma linha rítmica marcada mais pela cadência, a canção traz um vocal forte, mas menos gutural do que o costumeiro, mostrando uma cara diferente do Kreator. Os riffs marcantes estão lá, a bateria frenética, e a velocidade típica em vários momentos. Há menos tensão do que o normal esperado, mas a melodia casa-se com a intenção da letra. A ultima estrofe tem um andamento muito rápido, com as palavras sendo declamadas na mesma velocidade, acompanhando o ritmo da base sonora, e depois é sucedida pelo solo de guitarra, e que retorna depois à frase principal fechando a canção de maneira incrível, com Mille Petrozza gritando “The promise of a better future is nothing but a lie”.

Essa é com certeza uma maneira de dizer que as coisas não iam bem no mundo, e que mesmo após o fim das tensões da guerra fria, nem por isso as coisas estavam melhores, pois outros agentes estavam pressionando as pessoas rumo ao caos. E no fim das contas, nem o capitalismo nem o socialismo foram capazes de trazer a felicidade à humanidade, pois as pessoas são, por natureza, propensas ao individualismo.

As corporações, os governos, os opositores, os teóricos. Depois da queda do Muro de Berlim todos prometeram um futuro melhor, e muito acreditaram nos “ventos da mudança” quando na verdade, vivíamos (e ainda vivemos) a “paranóia do mundo material”, trabalhando muito, vivendo pouco e pensando nada.

Referencias:

CHRISTIE, Ian. Heavy Metal: a história completa. São Paulo: Editora Arx, 2010.

HOBSBAWN, Eric. Era dos Extremos: O Breve Século XX (1914-1991). São Paulo; Companhia das Letras, 1995.

MERTON, Robert K. e LAZARSFELD, Paul F.: Comunicação de Massa, Gosto Popular e a Organização da Ação Social. In: ______LIMA, L.C. (coord.) Teoria da cultura de massa. São Paulo: Paz e Terra, 2000.

MONIZ BANDEIRA, Luiz Alberto. A Reunificação da Alemanha: do ideal socialista ao socialismo real. 3ª edição, São Paulo: Editora Unesp; 2009.

NAPOLITANO, Marcos. A História depois do papel. In PINSKY, Carla Bassanezi (org.) Fontes Históricas. 2ª Edição, São Paulo: Contexto, 2010.
______. História e Música: História cultural da música popular. 3ª Ed. Belo
Horizonte: Editora Autêntica, 2005.

Um comentário:

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